DE VIDEIRA, RAMOS, PODA, FRUTOS... E O AGRICULTOR
- Frei Basílio de Resende ofm
- 30 de abr. de 2024
- 6 min de leitura
Atualizado: 28 de mai. de 2024
HOMILIA DO QUINTO DOMINGO DA PÁSCOA
JOÃO 15,1-8
VOCÊ É VIVENTE?
Neste tempo de Páscoa (na Europa), no momento em que toda a natureza se põe a florir, o Evangelho de hoje nos propõe uma pequena lição de biologia elementar.
Jesus não era um cientista, no sentido moderno do termo. No entanto suas observações sobre a vida da cepa da vinha são absolutamente exatas: é a verdade ancestral dos camponeses que sabem, muitas vezes, melhor que os pesquisadores das leis da vida nos laboratórios.
O QUE É VIVER?
Para o ramo de uma árvore, viver é estar ligado ao tronco. Essa é uma mensagem compreensível proposta por Jesus hoje.
Sim, para o ramo da vinha, a alternativa é simples e decisiva. É uma questão de vida ou de morte. Se ele está ligado ao tronco, se ele é bem alimentado pela seiva, é a vida, o crescimento, a uva garantida. Se, ao contrário, ele está separado do tronco, é o ressecamento, a esterilidade, a morte.
Não precisa ser um sábio biólogo para saber isso. Não importa quem possa fazer a experiência com qualquer tipo de ramo cortado de uma árvore.
E Jesus tira daí a conclusão radical: “Sem mim, vocês não podem fazer nada. Se alguém não permanece em mim é como um ramo que se lança fora e que seca. Os ramos secos são lançados ao fogo e se queimam”.
Essas palavras são palavras divinas, palavras da revelação, que são oferecidas à nossa fé e que nós podemos crer ou não.
Se for preciso, a situação Daquele que disse essas palavras nos provará: Jesus de Nazaré disse isso que acabamos de ouvir, na véspera de morrer. Ora, Ele teve a audácia e a pretensão de nos falar da “vida” e da “morte”, e de dizer que todo ser humano que não estiver “ligado a Ele” morrerá. As palavras “vida” e “morte” nos lábios de Jesus têm, então, um sentido totalmente diferente do habitual. Ele não fala da vida biológica, nem da morte biológica, mas de uma “outra vida” e de “outra morte”.
ENTÃO, DE QUE VIDA FALA JESUS?
No Evangelho de João, Jesus mesmo fala dezessete vezes da vida eterna (
Jo 3,15.16.36; 5, 24.59; 6, 27.40.47.68; 10,28; 12,25.50; 17,2.3).
Um dia, preparando o batismo de uma criança com um casal em que um dos dois cônjuges se dizia ateu militante, eu lhe coloquei a questão: “Para você, a vida de seu filhinho será o quê no momento da morte dele?” Ele respondeu-me: “Eu bem o sei, será o nada!”
Mas Jesus vai bem mais longe. Seu pensamento é mais radical. Ele não fala do futuro. Ele diz que, já agora, o que não está ligado à fonte da vida, à videira, a Deus, está seco e morto.
A pessoa que escuta isso, é claro que pode recusar a revelação que lhe é feita. Nós somos livres para crer ou não crer. E nós temos este terrível poder de dizer a Jesus, seguindo o raciocínio de nossa razão e autossuficiência: “Jesus, tu dizes cosias falsas. Jesus eu não creio em ti.”
Mas, que risco, então, corremos!
Porque, no fundo, nós não temos os meios para verificar este tipo de verdade, pois trata-se de uma perspectiva divina, e, por isso, totalmente fora de nosso alcance.
LIÇÃO DE BIOLOGIA ELEMENTAR:
PERMANECER... PODAR/LIMPAR... FRUTIFICAR...
Três verbos ativos resumem a lição de biologia elementar dada por Jesus falando da vinha.
Permanecer. Essa palavra retorna como um refrão, oito vezes em algumas linhas! “Permaneçam em mim como eu permaneço em vocês...” Esse verbo é uma das palavras chaves da Bíblia. Permanecer, imagem de permanência, de continuidade; imagem de comunhão e de intimidade; imagem de amor; imagem conjugal: “Meu amado é para mim e eu sou para ele”, dizia o Cântico dos Cânticos. “Quem permanece em mim e em quem eu permaneço”, diz Jesus. Esta palavra permanecer, não significa apenas ficar, morar, residir, habitar; ela significa mais profundamente “viver com”. Ao escutar essa palavra, nós não podemos não pensar na Eucaristia, sacramento por excelência da Aliança que sob o simbolismo do pão que nós comemos, faz Jesus morar no mais prfundo do nosso ser. Aliás, Jesus utilizou precisamente esta mesma fórmula no famoso discurso sobre o Pão da Vida: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele” (Jo 6,56).
Podar. A poda da vinha é um dos grandes trabalhos do vinhateiro. Jesus fez muitas vezes esse gesto, ele que era um camponês de Nazaré, onde as vinhas são tão belas. Todo vinhateiro sabe que uma vinha sem podar, ao fim de 2 ou 3 anos só produz madeira e folhas, sem frutos. Podar, limpar é uma imagem de purificação, de provação. É preciso, sem cessar, cortar, limpar, para concentrar a seiva nos ramos essenciais. E quando a podamos, a vinha chora e sangra: quando o trabalhador corta um ramo vivo, uma seiva abundante corre sobre o solo antes que os tecidos feridos se cicatrizem. Quando não se conhece bem esse ofício a gente é tentado a criticar o vinhateiro: “Que maldade está fazendo aí!”; Ele nos responde: “Não é por prazer que eu sacrifico uma parte dos ramos da minha vinha; é porque eu a amo e quero que ela produza frutos... Aguarde a colheita e você verá.” É isso que diz Jesus... “para que (a vinha) dê mais fruto”.
Frutificar. Esta expressão, também, é repetida 5 vezes nesta página. “Dar fruto... Produzir muito fruto.” É isso que Jesus propõe à humanidade. Frutificar é o sinal da vida. Deus não zombou do ser humano ao criá -lo, afinal de contas, para nada! Deus não inventou uma peça mortal ao chamar à vida os seus filhos! Deus é o vivente! Ele nos propõe sua própria vida, sua Vida eterna. Para isso Ele nos fez “membros do Corpo de Cristo”, como o dirá São Paulo (1Cor 6,15). E Jesus ousa dizer que nós somos membros Dele, somos ramos da vinha... como uma parcela viva do Deus vivo.
Uma camponesa da Galileia me disse, um dia, que ela tem uma cepa de vinha que dá em torno de 350 cachos de uva a cada ano! É uma vinha maravilhosa que está plantada na porta de sua casa e que sobe até o terraço, no céu.
A nossa vida não está reduzida ao que nossos olhas vêm; uma vida muito pequena! Nossa vida é a grande vida do próprio Deus.
Acreditamos nisso?
“Uma bela vinha produzindo muitos frutos. Meu crescimento chegou? Será que estou vivo/a, que sou vivente? Será que eu deixo que o agricultor cuide de minha vida espiritual, de minha vida eterna? “
(Do livro “Les Entretiens du Dumanche”, Noel Quesson, Année B, ‘Droguet-Ardant, 1991, p. 72-75. Tradução de Frei Basílio de Resende ofm)
DO OFÍCIO DAS LEITURAS DA TERÇA FEIRA
DA QUINTA SEMANA DA PÁSCOA
SEGUNDA LEITURA
Do Comentário sobre o Evangelho de São João, de São Cirilo de Alexandria. Bispo. (Século V)
Eu sou a videira, vós os ramos
Eu sou a videira, vós os ramos
Querendo mostrar a necessidade de estarmos unidos a ele pelo amor, e a
grande vantagem que nos vem desta união, o Senhor afirma que é a videira.
Os ramos são os que, já se tornaram participantes da sua natureza pela
comunicação do Espírito Santo. De fato, é o Espírito de Cristo que nos une a ele.
A adesão a esta videira nasce da boa vontade; a união da videira conosco
procede do seu afeto e natureza. Foi, de fato, pela boa vontade que nos
aproximamos de Cristo, mediante a fé; mas participamos da sua natureza por termos recebido dele a dignidade da adoção filial. Pois, segundo São Paulo, quem adere ao Senhor torna-se com ele um só espírito (1Cor 6,17).
Do mesmo modo, o autor sagrado, noutro lugar da Escritura, dá ao Senhor o nome de alicerce e fundamento. Sobre ele somos edificados como pedras vivas e espirituais, para nos tornarmos, pelo Espírito Santo, habitação de Deus e formarmos um sacerdócio santo. Entretanto, isto só será possível se Cristo for nosso fundamento. A mesma coisa vem expressa na analogia da videira: Cristo afirma ser ele próprio a videira e, por assim dizer, a mãe e a educadora dos ramos que dela brotam.
Nele e por ele fomos regenerados no Espírito Santo, para produzirmos frutos de vida, não da vida antiga e envelhecida, mas daquela vida nova que procede do amor para com ele. Esta vida nova, porém, só poderemos conservá-la se nos mantivermos perfeitamente inseridos em Cristo, se aderirmos fielmente aos santos mandamentos que nos foram dados, se guardarmos com solicitude este título de nobreza adquirida e se não permitirmos que se entristeça o Espírito que habita em nós, quer dizer, Deus que por ele mora em nós. O evangelista João nos ensina sabiamente de que modo estamos em Cristo e ele em nós, quando diz: A prova de que permanecemos com ele, e ele conosco, é que ele nos deu o seu Espírito (1Jo 4,13).
Assim como a raiz faz chegar aos ramos a sua seiva natural, também o
Unigênito de Deus concede aos homens, sobretudo aos que lhe estão unidos pela fé, o seu Espírito. Ele os conduz à santidade perfeita, comunica-lhes a afinidade e parentesco com sua natureza e a do Pai, alimenta-os na piedade e dá-lhes a sabedoria de toda virtude e bondade.
Responsório
Ficai em mim e eu em vós hei de ficar:
Como o ramo não dá fruto por si mesmo
se não fica bem unida à videira,
assim vós, se não ficais a mim unidos. Al eluia.
Eu vos designei para que vades e deis frutos
e o vosso fruto permaneça.
Paz plena. A "FÉ" é sim o maior empecilho para que uma pessoa possa compreender bem a Verdade, que liberta e plena (Jo 8,32 e 16,13).
Nós estamos vivendo o tempo (kairos), que está profetizado em João 16,13, mas poucos teólogos estão em condições que compreender, entender e aceitar essa profecia.
Paz plena. Todo aquele que está buscando uma compreensão da Verdade tem que fazer seguinte pergunta:
"Como João escreveu o Quarto Evangelho umas quatro décadas, após a morte de Jesus, será se o que ele escreveu foi o que Jesus disse ou a compreensão que ele passou a ter sobre Jesus?"