FRATELLI TUTTI - Oito pontos para entender
- Frei Basílio de Resende ofm
- 28 de set. de 2021
- 10 min de leitura
Oito pontos para entender a "Fratelli Tutti", nova encíclica do Papa Francisco
Novo documento reforça a 'cruzada' de Francisco de Roma (2013 - ...) em prol da construção da fraternidade humana, local e universal.
No domingo (03/10/2020), véspera da memória litúrgica de São Francisco de Assis, o 'Papa dos Pobres', Papa Francisco, fez nascer, na mesma pequenina cidade de Assis, na Itália, um novo caminho para a fraternidade cristã e sua missão no mundo e para o mundo, segundo os desígnios do Criador e o envio de Cristo.
A nova encíclica pretende responder à seguinte questão:
"Quais são os grandes ideais,
mas também os caminhos concretos,
para aqueles que querem construir um mundo mais justo e fraterno
nas suas relações quotidianas,
na vida social, na política e nas instituições?".
O documento, tratado pelo próprio Papa como "encíclica social", tem como pano de fundo as "admoestações", Ad VI e XXV, que São Francisco de Assis dirigia aos seus irmãos de comunidade, de forma a incentivar a vivência dos valores do Evangelho. Tendo como pano de fundo a pandemia da Covid-19, que, conforme revela Francisco, "irrompeu de forma inesperada quando eu estava escrevendo esta carta", a Fratelli Tutti quer mostrar:
· que "ninguém se salva sozinho"
· e que chegou realmente o momento de "sonhar com uma única humanidade",
na qual somos "todos irmãos".
Em 8 capítulos, o Bispo de Roma destaca quais os pontos essenciais para que a fraternidade entre os povos possa, enfim, ser restaurada, segundo os valores do Santo Evangelho.
Confira quais são eles e junte-se a este homem de Deus nesta cruzada:
· pela defesa e promoção da dignidade inviolável da pessoa humana,
· pela paz,
· pela justiça social nas comunidades locais, nacionais e internacionais,
· pelo respeito à vida
· e pela unidade da família humana.
Ns 1 - 8 - Inspirado em São Francisco de Assis, nas Admoestações VI e XXV, e no seu encontro com o Sultão Malil-al-Kamil, no Egito (1Cel 57; LM IX,8), que sonhou e procurou realizar uma fraternidade sem fronteiras, segundo o Evangelho de Jesus Cristo, o Bispo de Roma, Francisco, expressa um ardente desejo de "fazer renascer, entre todos, um anseio mundial de fraternidade" (n. 8)
Capítulo 1: "As sombras dum mundo fechado" (n. 9 – 55)
O capítulo inicial trata das distorções que alguns dos conceitos mais importantes para uma convivência saudável entre todos possa estabelecer-se e permanecer - a democracia, a liberdade e a justiça:
· o egoísmo e a falta de interesse pelo bem comum;
· a prevalência de uma lógica de mercado baseada no lucro e na cultura do descarte;
· o desemprego, o racismo, a pobreza;
· a desigualdade de direitos e as suas aberrações, como a escravatura, o tráfico de pessoas, as mulheres subjugadas e depois forçadas a abortar, o tráfico de órgãos, etc.
Estes são problemas globais, que requerem ações globais, sublinha o Papa.
Capítulo 2: "Um estranho no caminho" (n. 56 – 86)
Neste capítulo, o Pontífice denuncia "uma sociedade doente, que vira as costas à dor e é 'analfabeta' no cuidado dos mais frágeis e vulneráveis".
O documento afirma que "somos todos chamados a estar próximos uns dos outros, superando preconceitos e interesses pessoais".
"O amor constrói pontes e nós somos feitos para o amor", acrescenta o Papa.
Capítulo 3: "Pensar e gerar um mundo aberto" (n. 87 – 127)
O Santo Padre fala também sobre o princípio da "capacidade de amar segundo uma dimensão universal".
Trazendo mais uma vez à tona a "cultura do encontro" e de "uma Igreja em saída", Francisco exorta cada um de nós a "sair de si mesmo" para encontrar nos outros "um acrescentamento de ser", abrindo-nos ao próximo segundo o dinamismo da caridade, que nos faz tender para a "comunhão universal".
Ainda neste capítulo, Francisco destaca a função imprescindível da educação dada pela família, bem com questões como o direito à vida com dignidade. "Ninguém pode ser excluído, independentemente do local onde nasceu".
É preciso pensar numa "ética das relações internacionais", porque cada país é também do estrangeiro e os bens do território não podem ser negados àqueles que têm necessidade e vêm de outro lugar.
Desta forma, o direito natural à propriedade privada será, portanto, secundário.
Por fim, o capítulo aborda a questão da dívida externa: "embora se mantenha o princípio de que toda a dívida legitimamente contraída deve ser paga, espera-se, no entanto, que isto não comprometa o crescimento e a subsistência dos países mais pobres".
Capítulo 4: "Um coração aberto ao mundo inteiro" (n. 128 – 153)
Este capítulo é dedicado inteiramente ao tema das migrações.
“Há narcisismos bairristas que não expressam um amor sadio pelo próprio povo e pela sua cultura” (n. 146)
Os migrantes devem ser acolhidos, protegidos, promovidos e integrados.
O Papa aponta algumas "respostas indispensáveis" sobre essa questão:
· especialmente para aqueles que fogem de "graves crises humanitárias", incrementar e simplificar a concessão de vistos; (n. 130)
· abrir corredores humanitários; (n. 130)
· oferecer alojamento, segurança e serviços essenciais; (n. 130)
· oferecer possibilidade de trabalho e formação; (n. 130)
· favorecer a reunificação familiar;
· proteger os menores e assegurar-lhes o acesso regular à educação; (n. 130)
· garantir a liberdade religiosa. (n. 130)
· aos que já fazem parte do tecido social conceder-lhes o direito de cidadania plena (n. 131)
· encontro de pessoas e de culturas que se enriquecem mutuamente (n. 133)
· ajuda mútua entre países (n. 137), entre Ocidente e Oriente (n. 136)
A gratuidade que acolhe (n. 139-141), local e universal (ns 142 – 153)
Acima de tudo, pede uma legislação global para as migrações que vá além das emergências individuais.
Capítulo 5: "A melhor política" (n. 154 – 197)
Neste capítulo o Santo Padre afirma que "a melhor política" é aquela que representa uma das formas mais preciosas da caridade, porque está a serviço do bem comum e conhece a importância do povo.
Este é o popularismo (n. 157 -159) indicado por Francisco, que se contrapõe ao "populismo" (n. 155 – 156. 160 – 161), que ignora a legitimidade da noção de "povo", atraindo consensos a fim de o instrumentalizar demagogicamente a serviço do seu projeto pessoal, de grupos privados ou de classe dominante.
Quatro questões são primordiais:
· A proteção ao trabalho como "uma dimensão indispensável da vida social", visa assegurar que cada um tenha a possibilidade de desenvolver as suas próprias capacidades.
· A verdadeira estratégia contra a pobreza não visa simplesmente a conter os necessitados, mas a promovê-los na perspectiva da solidariedade e da subsidiariedade.
· A necessário eliminar definitivamente o tráfico de seres humanos, "vergonha para a humanidade",
· E eliminar a fome, que é "criminosa", porque a alimentação é "um direito inalienável".
O Santo Padre espera que se possa passar de uma política "para" os pobres para uma política "com" e "dos" pobres, inclusive com um pedido de reforma da ONU, que "deve promover a força da lei sobre a lei da força".
Capítulo 6: "Diálogo e amizade social" (198 – 225)
Citando o nosso poeta Vinícius de Moraes, a Fratelli Tutti conceitua a vida como "a arte do encontro" com todos, também com as periferias do mundo e com os povos originais, porque "de todos se pode aprender alguma coisa: ninguém é inútil, ninguém é supérfluo".
O Papa faz um apelo ao "milagre da amabilidade", uma atitude a ser recuperada, porque é "uma estrela na escuridão" e uma "libertação da crueldade, da ansiedade que não nos deixa pensar nos outros, da urgência distraída", que prevalecem hoje em dia.
Vale a pena ler/relar/meditar/internalizar: Recuperar a amabilidade, ns. 222 – 224.
Capítulo 7: "Percursos dum novo encontro" (ns. 226 – 270)
Refletir sobre o valor e a promoção da paz é o convite deste capítulo sobre as guerras, no qual o Papa sublinha que a paz é "proativa" e visa formar uma sociedade baseada no serviço aos outros e na busca da reconciliação e do desenvolvimento mútuo.
Ligado à paz está o perdão: devemos amar todos sem exceção, mas amar um opressor significa ajudá-lo a mudar e não permitir que ele continue a oprimir o seu próximo. Perdão não significa impunidade, mas justiça e memória, porque perdoar não significa esquecer, mas renunciar à força destrutiva do mal e da vingança.
Francisco também pede para nunca esquecer "horrores", perseguições e massacres étnicos, que devem ser sempre recordados novamente, para não nos anestesiarmos e para manter viva a chama da consciência coletiva.
A guerra, segundo o Papa, é "uma ameaça constante", que representa a "negação de todos os direitos", "o fracasso da política e da humanidade", "a vergonhosa rendição às forças do mal".
Temos de reafirmar fortemente "Nunca mais a guerra!", sugere o Papa, que ainda pede que, com o dinheiro do armamento, deveria ser criado um Fundo Mundial para acabar de vez com a fome.
Sobre a pena de morte, o Papa reafirma que é inadmissível e deve ser abolida em todo o mundo.
Capítulo 8: "Religiões ao serviço da fraternidade no mundo" (ns. 271 – 287)
O terrorismo não se deve à religião,
· mas a interpretações erradas de textos religiosos,
· bem como a políticas de fome, pobreza, injustiça e opressão. (n. 283)
Um caminho de paz entre a religiões é, portanto, possível; por isso, é necessário garantir a liberdade religiosa, direito humano fundamental para todos.
E aqui está o papel da Igreja: ela não relega a sua missão à esfera privada (à intimidade do crente e religioso com o seu Deus) e, embora não fazendo política (a militância de um partido político, sua ideologia e programa visando galgar ao poder de governança), não renuncia à dimensão política da existência, à atenção ao bem comum e à preocupação pelo desenvolvimento humano integral, (n. 276) segundo os princípios evangélicos.
Fonte: Vatican News + elaboração e formatação de Frei Basílio de Resende ofm.
Para a Assembleia Sub-Regional da CRB da Arquidiocese de Montes Claros
e Dioceses de Januária, de Janaúba e de Paracatu, 11 e 12 de setembro de 2021.
Noviciado São Benedito, Montes Claros -
Blog: freibasilioderesende.org
FRATELLI TUTTI: SETE LIÇÕES
SOBRE FRATERNIDADE E AMIZADE
(Fonte: marista.org.br 05/11/2020)
Em sua mais recente encíclica, a “Fratelli Tutti”, o Papa Francisco fez uma convocação a vivermos unidos em uma grande comunidade global. Dedicada à “fraternidade e à amizade social.
Inspirado no exemplo de São Francisco de Assis”, - citando as Admoestações V e XXV - o chamamento do Santo Padre teve ampla repercussão na sociedade e suscitou muitas pessoas à reflexão: quais são os caminhos possíveis para seguirmos em direção a um mundo mais justo e fraterno?
Em seguida, separamos alguns dos destaques desse riquíssimo material escrito por Francisco.
1- Consciência sobre o mundo
O Papa concentra um esforço na encíclica em fazer uma avaliação de fatores que dificultam o desenvolvimento da fraternidade universal. Ele reflete que depois de um período de avanços em direção à união das nações, o mundo voltou a ter sinais de retrocesso.
“Encontramo-nos mais sozinhos do que nunca neste mundo massificado, que privilegia os interesses individuais e debilita a dimensão comunitária da existência”. (n. 12).
A falta de consciência histórica, a estratégia política da polarização e desagregação das pessoas em alguns países, a falta de um projeto que abranja a todos, e a desvalorização de determinados grupos de pessoas, como os idosos e imigrantes, são alguns dos pontos enfatizados por Francisco.
2- Base na esperança
O Papa Francisco também convoca as pessoas a ouvirem a voz dos percursos de esperança possíveis de serem traçados. O amor é o ponto em comum a todos esses caminhos.
Esperança ns. 54-55 ! 77 !
“Crescemos em muitos aspectos, mas somos analfabetos no acompanhar, cuidar e sustentar os mais frágeis e vulneráveis das nossas sociedades desenvolvidas” (n. 64).
3- Agir com empatia com o próximo
Francisco reflete na “Fratelli Tutti” que o amor universal pressupõe uma capacidade de nos abrirmos para o próximo. Para o papa, Jesus não nos ensinou a perguntar quem é nosso vizinho, mas sim a nos tornarmos vizinhos próximos dos outros.
n. 60.71.
“A proposta é fazer-se presente a quem precisa de ajuda, independentemente de fazer parte ou não do próprio círculo de pertença”.
Nesse ponto, Francisco incentiva a empatia com os imigrantes do mundo inteiro. Ele clamou que as pessoas nessa situação sejam acolhidas, protegidas, promovidas e integradas.
4- Um mundo melhor passa por uma política melhor
O Santo Padre mencionou a política como um espaço importante na solução dos problemas vividos pelo mundo, onde a representatividade das pessoas deve ser colocada verdadeiramente a serviço do bem comum.
“É necessário fazer crescer não só uma espiritualidade da fraternidade, mas também e ao mesmo tempo uma organização mundial mais eficiente para ajudar a resolver os problemas prementes dos abandonados que sofrem e morrem nos países pobres”.
5- Convite ao diálogo permanente
O Papa enfatizou também que a construção de uma sociedade melhor exige diálogo. Ele chamou de “heróis do futuro” aqueles que conseguirem quebrar a lógica da sociedade atual de não conseguir estabelecer pontos de convergência. Para isso, o Santo Padre alerta que será preciso ultrapassar as conveniências pessoais, com a sustentação de uma palavra respeitosa e com palavras densas em verdade.
“O diálogo perseverante e corajoso não faz notícia como as desavenças e os conflitos; e contudo, de forma discreta mas muito mais do que possamos notar, ajuda o mundo a viver melhor”
6- Recomeçar a partir da verdade
Na reta final da carta, o papa reflete que muitos países carecem do que ele chamou de “artesãos de paz prontos a gerar, com inventiva ousadia, processos de cura e de um novo encontro.” Isso passa pela construção de uma memória de penitência, “capaz de assumir o passado para libertar o futuro”.
n. 237 – verdade, justiça, misericórdia
“O percurso para a paz não implica homogeneizar a sociedade, mas permite-nos trabalhar juntos. Pode unir muitos nas pesquisas comuns, onde todos ganham”.
Na visão de Francisco, o processo de construção de paz está diretamente ligado com o perdão e é um compromisso perpétuo com o diálogo. E isso não apenas em relação a grupos rivais que até mesmo guerrearam entre si. As “desigualdades e a falta de desenvolvimento humano” também geram feridas que impedem a construção da paz, na visão do papa.
“Aqueles que perdoam de verdade não esquecem,
mas renunciam a deixar-se dominar
pela mesma força destruidora que os lesou” (251).
7- Religiões devem agir a serviço da fraternidade
Por fim, para fechar os destaques da encíclica “Fratelli Tutti”, o papa Francisco deu alguns dos maiores exemplos na promoção da aproximação e tolerância entre diferentes religiões. Já visitou pessoalmente Bartolomeu, o Patriarca da Igreja Ortodoxa e o Grande Imã Ahmad Al-Tayyeb, um dos principais líderes muçulmanos. Na encíclica, o Santo Padre suplicou:
“Existe um direito humano fundamental que não deve ser esquecido no caminho da fraternidade e da paz: é a liberdade religiosa para os crentes de todas as religiões”.
A encíclica “Fratelli Tutti” do Papa foi um convite inspirador a nos empenharmos na construção de um mundo melhor.
Então, vamos juntos praticar a fraternidade universal?
(Fonte: marista.org.br + elaboração e formatação de Frei Basílio de Resende ofm.
Para a Assembleia Sub-Regional da CRB da Arquidiocese de Montes Claros
e Dioceses de Januária, de Janaúba e de Paracatu, 11 e 12 de setembro de 2021.
Noviciado São Benedito, Montes Claros –
Blog: freibasilioderesende.org)
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