"O HOMEM; AS VIAGENS" de Carlos Drumond de Andrade
- Frei Basílio de Resende ofm
- 4 de nov. de 2020
- 2 min de leitura
"No poema 'O Homem; As Viagens' Drumond contrapõe uma visão humanista
à tecnocracia da corrida espacial"
Carlos Machado.
"E como ficou chato ser moderno. Agora serei eterno"
Carlos Drumond de Andrade
O Homem; As Viagens
O homem, bicho da terra tão pequeno Chateia-se na terra Lugar de muita miséria e pouca diversão, Faz um foguete, uma cápsula, um módulo Toca para a lua Desce cauteloso na lua Pisa na lua Planta bandeirola na lua Experimenta a lua Coloniza a lua Civiliza a lua Humaniza a lua.
Lua humanizada: tão igual à terra. O homem chateia-se na lua. Vamos para marte - ordena a suas máquinas. Elas obedecem, o homem desce em marte Pisa em marte Experimenta Coloniza Civiliza Humaniza marte com engenho e arte.
Marte humanizado, que lugar quadrado. Vamos a outra parte? Claro - diz o engenho Sofisticado e dócil. Vamos a vênus. O homem põe o pé em vênus, Vê o visto - é isto? Idem Idem Idem.
O homem funde a cuca se não for a júpiter Proclamar justiça junto com injustiça Repetir a fossa Repetir o inquieto Repetitório.
Outros planetas restam para outras colônias. O espaço todo vira terra-a-terra. O homem chega ao sol ou dá uma volta Só para tever? Não-vê que ele inventa Roupa insiderável de viver no sol. Põe o pé e: Mas que chato é o sol, falso touro Espanhol domado.
Restam outros sistemas fora Do solar a colo- nizar. Ao acabarem todos Só resta ao homem (estará equipado?) A dificílima dangerosíssima viagem De si a si mesmo: Pôr o pé no chão Do seu coração Experimentar Colonizar Civilizar Humanizar O homem Descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas A perene, insuspeitada alegria De con-viver
(in "As Impurezas do Branco", Carlos Drumond de Andrade, José Olympio RJ, 1973)
Nossa, décadas se passaram e o texto continua tão atual... Adorei Frei!