top of page

UMA LEITURA PARA O ADVENTO: Os Estatutos do Homem - Thiago de Mello

  • Foto do escritor: Frei Basílio de Resende ofm
    Frei Basílio de Resende ofm
  • 12 de dez. de 2022
  • 4 min de leitura

O Advento é um tempo litúrgico - para os cristãos - grávido de uma espiritualidade de vigilância, de conversão, de mudança qualitativa, de preparação para receber uma visita. Um tempo de preparar o coração para acolher alguém que está para chegar; uma pessoa que está sempre próxima, que está às portas e bate para ser recebida no coração das pessoas, e, então tudo se renova e ganha novos significados. E essa pessoa não vem de longe, não vem de fora, ela é um novo Espírito; ela brota e surge de repente no íntimo e no coração de cada pessoa, ela surge e se revela no encontro entre pessoas, nos estilos de relações familiares, sociais, políticas, econômicas e culturais. Também entre povos, raças, nações, culturas, civilizações...


É um tempo de atiçar o desejo de uma mudança dos padrões e estilos de relacionamentos das pessoas consigo mesmas, com as outras pessoas, com o mundo, com a vida.


Nas leituras e celebrações das Comunidades Cristãs, ressoa uma voz forte antiga e sempre nova; ela convoca seus destinatários, e eventuais leitores, e os exorta, interpela, convoca. Anuncia a utopia de um tempo novo, e diferente. Convida a mudar as mentalidades, os corações, as atitudes, as relações de ódio em reconciliação, em práticas de justiça, para que a paz surja, para que o povo seja consolado...Manda transformar as armas de guerra em instrumentos de produção.


É a voz do genial e criativo poeta Isaias. O profeta do Deus vivo, o Criador dos povos e nações!


Apresento, também, para leitura desse tempo de Advento, um profeta e poeta contemporâneo nosso:





Os Estatutos do Homem

(Ato Institucional Permanente)

Thiago de Mello

A Carlos Heitor Cony


Artigo I.


Fica decretado que agora vale a verdade.

que agora vale a vida,

e que de mãos dadas,

trabalharemos todos pela vida verdadeira.


Artigo II.


Fica decretado que todos os dias da semana,

inclusive as terças-feiras mais cinzentas,

têm direito a converter-se em manhãs de domingo.


Artigo III.


Fica decretado que, a partir deste instante,

haverá girassóis em todas as janelas,

que os girassóis terão direito

a abrir-se dentro da sombra;

e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,

abertas para o verde onde cresce a esperança.


Artigo IV.


Fica decretado que o homem

não precisará nunca mais

duvidar do homem.

Que o homem confiará no homem

como a palmeira confia no vento,

como o vento confia no ar,

como o ar confia no campo azul do céu.


Parágrafo Único:

O homem confiará no homem

como um menino confia em outro menino.


Artigo V.


Fica decretado que os homens

estão livres do jugo da mentira.

Nunca mais será preciso usar

a couraça do silêncio

nem a armadura de palavras.

O homem se sentará à mesa

com seu olhar limpo

porque a verdade passará a ser servida

antes da sobremesa.


Artigo VI.


Fica estabelecida, durante dez séculos,

a prática sonhada pelo profeta Isaías,

e o lobo e o cordeiro pastarão juntos

e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.


Artigo VII.


Por decreto irrevogável fica estabelecido

o reinado permanente da justiça e da claridade,

e a alegria será uma bandeira generosa

para sempre desfraldada na alma do povo.


Artigo VIII.


Fica decretado que a maior dor

sempre foi e será sempre

não poder dar-se amor a quem se ama

e saber que é a água

que dá à planta o milagre da flor.


Artigo IX.


Fica permitido que o pão de cada dia

tenha no homem o sinal de seu suor.

Mas que sobretudo tenha sempre

o quente sabor da ternura.


Artigo X.


Fica permitido a qualquer pessoa,

a qualquer hora da vida,

o uso do traje branco.


Artigo XI.


Fica decretado, por definição,

que o homem é um animal que ama

e que por isso é belo.

muito mais belo que a estrela da manhã.


Artigo XII.


Decreta-se que nada será obrigado nem proibido.

tudo será permitido,

inclusive brincar com os rinocerontes

e caminhar pelas tardes

com uma imensa begônia na lapela.


Parágrafo único:

Só uma coisa fica proibida:

amar sem amor.


Artigo XIII.


Fica decretado que o dinheiro

não poderá nunca mais comprar

o sol das manhãs vindouras.

Expulso do grande baú do medo,

o dinheiro se transformará em uma espada fraternal

para defender o direito de cantar

e a festa do dia que chegou.


Artigo Final.


Fica proibido o uso da palavra liberdade.

a qual será suprimida dos dicionários

e do pântano enganoso das bocas.

A partir deste instante

a liberdade será algo vivo e transparente

como um fogo ou um rio,

e a sua morada será sempre

o coração do homem.


Santiago do Chile, abril de 1964

Publicado no livro

“Faz Escuro Mas Eu Canto: Porque a Manhã Vai Chegar” (1965).


Amadeu Thiago de Mello (Barreirinha, 30 de março de 1926Manaus, 14 de janeiro de 2022) foi um poeta, jornalista[1] e tradutor brasileiro.

Foi considerado um dos poetas mais influentes e respeitados no país, reconhecido como um ícone da literatura regional.

Biografia

Amadeu Thiago de Mello nasceu em Barreirinha, no Amazonas, em 1926. Ingressou na faculdade de medicina, mas abandonou o curso na metade, ingressando na diplomacia na década de 1950. Foi adido cultural na Bolívia e no Chile, mas teve sua carreira interrompida pelo golpe de 1964. Durante a ditadura (1964-1985) foi preso e depois exilou-se no Chile, onde encontrou Pablo Neruda, um amigo e colaborador.

No exílio, também morou na Argentina, Portugal, França e Alemanha. Com o fim do regime militar, voltou à sua cidade natal e depois mudou-se para Manaus, onde viveu até sua morte.[4]

Seu poema mais conhecido é Os Estatutos do Homem, onde o poeta chama a atenção do leitor para os valores simples da natureza humana. A preservação da Amazônia era tema presente em sua obra.[1] A sua poesia escrita foi Poesia Comprometida com a Minha e a Tua Vida que rendeu-lhe, em 1975, ainda durante o regime militar, um prêmio concedido pela Associação Paulista dos Críticos de Arte e tornou-o conhecido internacionalmente como um intelectual engajado na luta pelos Direitos Humanos.

Em homenagem aos seus 80 anos, completados em 2006, foi lançado pela Karmim o CD comemorativo A Criação do Mundo, contendo poemas que o autor produziu nos últimos 56 anos, declamados por ele próprio e musicados por seu irmão mais novo, Gaudêncio. Suas obras foram traduzidas para mais de trinta idiomas.

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.


 
 
 

Posts recentes

Ver tudo
NOSSA SEXUALIDADE HUMANA - II

Antes de publicar este texto, quis ouvir o parecer de Euler Carvalho Cruz, de Belo Horizonte: um engenheiro mecânico especialista mundial...

 
 
 
NOSSA SEXUALIDADE HUMANA - I

INTRODUÇÃO:     Uma dinâmica de auto percepção e auto exploração feita com rapazes candidatos â vida religiosa franciscana, no...

 
 
 

Comments


Faça parte da nossa lista de emails

Obrigado pelo envio!

  • White Facebook Icon
  • White Twitter Icon
bottom of page